terça-feira, 11 de maio de 2010

Outro Brasil


Um dia meu marido me perguntou se eu gostaria de ter nascido em outro país. Na hora não soube responder, apenas disse que achava que não, evasivamente. Hoje estou pensando naquela pergunta e já defini a resposta: não. Eu gostaria apenas de ter nascido em outro Brasil.
Explico. Todos os países do mundo têm seus problemas, porque o mundo tem problemas. Em Bangladesh tem 27 mil pessoas por quilômetro quadrado então, não, obrigada. Nos Estados Unidos não se pode sorrir para uma criança na rua, e apertar a bochecha dela então, pode dar até processo. Em Cuba a saúde é totalmente gratuita e nem por isso é ruim, aliás, é ótima, mas há muita gente fugindo de lá, sem poder voltar nunca mais.
Uma vez, quando era estudante entrevistei o jornalista Mino Carta, para uma matéria do curso. No meio da entrevista a filha dele ligou de Londres e após desligar, ele rapidamente comentou sobre como ela se surpreendia com as diferenças entre lá e cá. “Lá, as pessoas leem livros nos trens”. Aqui também! Sempre que pego o metrô vejo pessoas lendo livros. Elas e as pessoas que por uma questão de espaço acabam tendo que ler também, o mesmo livro e bem de pertinho.
Cada país tem sua cultura, seus costumes e seus problemas. Mas eu gostaria sim que o Brasil fosse um pouco diferente. Muito, para dizer a verdade. E como esta coluna é sobre mulheres, vou falar apenas deste aspecto e não sobre a política, a economia e o desastre anunciado no Rio de Janeiro.
Fico bastante envergonhada com o meu gênero quando somos lembradas lá fora pelo que fazemos aqui dentro. Podemos culpar os estrangeiros por pensarem que no Brasil, as mulheres usam folhas de parreira no lugar das roupas? Ou que tem praia no shopping, na balada, nos programas de televisão? Creio que não.
Também sinto vergonha do gênero quando a noiva de um famoso craque do futebol aceita dele o dobro do dinheiro que ganharia para posar nua. E aí fico totalmente corada quando meus colegas de profissão tornam isso uma notícia. Me corrijam se eu estiver errada, mas não bastaria ele pedir? Não é à toa que o relacionamento não vingou.
A preocupação das brasileiras em manter a estética impecável está suplantando em muito a preocupação em manter a mente inteligente. Gostaria de usar uma palavra mais branda, mas burrice é o que se adapta mais confortavelmente ao caso. Cada dia mais belas, cada dia mais burras.
Claro que a mudança de paradigmas sempre pode nos surpreender. Este ano temos duas candidatas à Presidência da República, pela primeira vez em 25 anos de democracia. Mas a caminhada no sentido de fazer com que as mulheres brasileiras sejam lembradas por algo mais do que beleza e disponibilidade é longa.
Para isso acontecer temos que sair das discussões triviais que permeiam o imaginário feminino e explorar um mundo de possibilidades mais concretas e sensatas. As mulheres querem dominar o mundo inteiro e esquecem seu universo particular. Sejamos rainhas de nossos lares primeiro e depois, partamos para patamares mais elevados. Imprimindo aos poucos na sociedade, os valores que cultivamos primeiramente em casa, passaremos a ser lembradas por legados mais dignos do que os que nos perseguem hoje. O problema é que mesmo em casa a mulher não sabe mais quem é.
Confundimos exposição com impressão, pensando que em quanto maior quantidade estivermos espalhadas por aí, não importa fazendo o que, conquistaremos tudo aquilo que temos sonhado ao longo dos anos. Mas neste caso sou mais a favor da qualidade.
Muitos brasileiros ficaram ofendidos com a piada de mau gosto do ator americano Robin Williams, por ocasião da escolha do Brasil para sediar as Olimpíadas de 2016. Ele disse durante uma entrevista, para um talk show: “espero que ela (Oprah) não esteja chateada de perder as Olimpíadas. Chicago enviou Oprah e Michelle. O Brasil mandou 50 strippers e meio quilo de pó. Não foi justo”.
Também fiquei chateada, especialmente porque a piada veio de um americano, cujo país lança bombas sobre civis para defender uma suposta supremacia galgada em atos deliberados de dominação e exploração. Mas não posso culpá-lo por pensar assim. Muitas brasileiras querem enfrentar e ganhar o mundo de costas para ele.
Seremos bem vistas lá fora, quando aqui dentro, em nossa casa, aprendermos a fazer com que, do pescoço para baixo, sejamos apenas mulheres e não moedas de troca. Quando nossa voz for ouvida pelas nossas ideias e não pelas nossas medidas, o resto do mundo nos olhará nos olhos e entenderá que um grande país é feito de pessoas e não da exploração do que elas têm a oferecer.
Em contrapartida, o Brasil precisa rever as políticas públicas relacionadas às mulheres, que em grande parte são inclusivas apenas na letra. Precisa agregar os valores demonstrados pelas mulheres verdadeiramente brasileiras (aquelas que não desistem nunca) ao seu modo de pensar e gerir a sociedade. Onde há planejamento eficiente e ação eficaz, certamente há um toque feminino.

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