quinta-feira, 20 de junho de 2013

Meu protesto particular

Este blog tem mais ou menos três anos de existência e nunca me senti tão estarrecida diante de uma página em branco, como desta vez. Não é que me faltem palavras, é que elas estão saindo dolorosamente. Talvez pela primeira vez em quase dez anos de jornalismo, sinto dor ao escrever e por isso acho difícil saber por onde começar.
Estava viajando quando a turista norte-americana foi estuprada por três homens em uma van, no Rio de Janeiro. Você deve ter ouvido bastante essa história e deve ter acompanhado a todos os noticiários e a repercussão internacional, mas eu estava em um lugar onde não havia internet, sinal de celular e onde não me interessava ligar a televisão. Então descobri tardiamente essa atrocidade. E quando voltei a assistir telejornais, eles simplesmente não falavam mais sobre isso. O assunto se perdeu na onda gigantesca de protestos que cobriu o País nos últimos dias.
E o jornalismo é assim mesmo, rápido, factual, efêmero. Mas para mim, como mulher, como mãe, como cidadã, essa notícia não passou e não passará nunca. Já chorei por essa moça muitas vezes e já pedi a Deus que encontre um meio de livrá-la dessa dor. Não sei qual será, mas sei que Ele pode fazê-lo.
De qualquer forma, continuo afirmando que esse assunto não deve ser esquecido. Precisa ter uma bandeira em todos esses protestos que estamos acompanhando em tempo real, que lembre a tragédia dessa moça e do seu namorado, que também foi uma vítima de abuso, de certa forma,  além de violência e roubo. Não podemos esquecer, não podemos deixar passar. Não podemos simplesmente seguir a vida como se em algum lugar do mundo não houvesse uma moça que foi estuprada oito vezes por três monstros diante do namorado imobilizado, aqui no Brasil. E isto aconteceu na “cidade maravilhosa”, sede das próximas Olimpíadas e uma das cidades-sede da Copa do Mundo. Não temos o direito de esquecer isso, jamais.
A sociedade pós-moderna se considera altamente evoluída, puramente racional. Mas o que se vê cotidianamente é uma selva de homens cada vez mais primitivos. Uma “involução” rápida e impossível de frear. Com tanta oferta de sexo pago ou gratuito como se pode encontrar por aí, por que o número de vítimas de estupro só aumenta? Não, os homens não estão evoluindo. Eles estão dando vasão a seus instintos mais selvagens. Nunca na história do mundo, os homens foram tão boçais quanto são agora.
Uma notícia publicada pelo jornal O Globo, no dia 20 de janeiro deste ano destaca que nos últimos cinco anos houve um aumento de 157% no número de registros de estupros. Somente no Rio de Janeiro são 16 casos denunciados por dia. Aparecida Gonçalves, secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres, na mesma reportagem afirmou que “isso mostra o comportamento machista da nossa sociedade, que autoriza que homens se apropriem do corpo da mulher. É como se o homem não pudesse ouvir o não”. Bingo, Aparecida! Há homens, e infelizmente são muitos, que não sabem ouvir “não”.
Nós temos uma mulher na presidência e em grande parte das chefias mais importantes do Brasil, inclusive no setor da segurança pública. E mesmo assim, pouco se tem feito pela questão. É inaceitável que um País que se julga em pleno desenvolvimento, ainda permita que suas cidadãs e até mesmo as turistas que o visitam sejam tratadas como o parque de diversões da bandidagem. Quando é que isso vai acabar?
A notícia me deixou chocada em tantos níveis, que fica difícil conseguir explicar o tamanho da indignação. Fiquei envergonhada de viver em um País que se considera rico o suficiente para construir ou reformar estádios que serão eternos elefantes brancos, mas que não tem capacidade de defender suas mulheres e proteger suas turistas. Não é questão de discutir se a Copa do Mundo vai ser boa ou não para o País. A questão é que não temos a mínima condição de sediar este evento e mesmo assim teremos de engoli-lo. Se eu fosse turista jamais viria para cá, depois do que aconteceu com a norte-americana e do que acontece com uma brasileira a cada 12 segundos, conforme o jornal O Dia.
A igualdade feminina aconteceu apenas em setores onde isso não incomoda demais aos homens. Porque no campo sexual, a dominação masculina ainda é uma dura realidade. E os números alarmantes dos casos de estupros no País demonstram isso. Existe um número crescente de homens dispostos a conseguir pela força, aquilo que são incapazes de conquistar pelo mérito. Lamentável demais.
Assistindo ao depoimento da colega jornalista que recebeu um tiro de bala de borracha, de um policial em São Paulo, enquanto cobria os protestos, fiquei pensando no quanto existem homens covardes em nosso País. Ela disse que jamais imaginava que ele fosse atirar, por ela ser mulher e não estar representando perigo. Se eu pudesse dizer alguma coisa a ela, seria: “amiga, ele atirou justamente porque você é mulher!”.  Atrás de uma farda, com uma arma na mão e sem se sentir ameaçado é muito fácil ser machão. O mesmo serve para esses monstros estupradores: é fácil ser viril segurando um revólver e subjugando a vítima. Difícil mesmo é ser homem de verdade e merecer a disponibilidade sexual de uma companheira.
Meu protesto particular não é pelos R$0,20. É pelas minhas leitoras, pela minha filha, pela minha mãe, irmã, avó, tias, primas, amigas, vizinhas, conterrâneas. Não tem ninguém, de nenhum dos três poderes, olhando por nós. O que mais precisa acontecer para que este País tenha leis mais severas para o estupro, como a castração química, por exemplo? Sinceramente, tenho medo dessa resposta.

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