segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Sexo frágil?!


Acho interessante quando alguém, em plena vigência da pós-modernidade chama as mulheres de “sexo frágil”. Deveria ser, supostamente. Suportamos menos peso e temos alguma dificuldade com vidros de azeitona e portas emperradas, mas definitivamente o estereótipo que já nos definiu, no passado, como sexo frágil, não existe mais.
A
companhe o raciocínio. Não vamos ao médico enquanto uma dor não vier acompanhada de pelo menos mais um sintoma real. Suportamos a jornada dupla de trabalho. Temos extensos e dolorosos trabalhos de parto e não fugimos deles, a menos que seja preciso. Preferimos sempre a verdade, mesmo que ela não se encaixe em nosso planejamento. Temos um planejamento. Nos acabamos de chorar no travesseiro por uma noite inteira, mas pela manhã um pouco de gelo e um bom corretivo resolvem nosso problema. Entendemos, desde muito cedo, que cada escolha representa uma renúncia. Somos capazes de morrer de amor e tristeza por filhos, maridos e famílias, mas aprendemos a renascer, sempre que necessário. Onde está a fragilidade em tudo isso?

A
ideia do sexo frágil é tentadora. Faz parte de uma utopia que criamos. Queremos mesmo ser frágeis, protegidas, amadas, veneradas, consoladas e cuidadas como se fôssemos feitas de cristal. Mas quando não somos, sacudimos a poeira e seguimos em frente, fazendo por nós mesmas, aquilo que alguém deixou de fazer. Não é à toa que mundo afora, há milhares de mulheres que chefiam a família porque o marido ou companheiro foi embora. E dão conta de cinco, seis, oito filhos, da casa e de um emprego que banque tudo isso. Força total!

D
e fato, cresceu o número de mulheres que chefiam a casa. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio de 2009, divulgados este ano pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que de 2001 a 2009, a proporção de famílias chefiadas por mulheres no Brasil subiu de aproximadamente 27% para 35% do total. São mulheres solteiras, separadas ou viúvas que têm filhos, solteiras sem filhos, morando sozinhas, entre outras. Mas o perfil que mais chama a atenção é o das mulheres casadas chefiando a família, mesmo tendo um marido ou companheiro em casa, com ou sem filhos. Em 2009, 14,2% dos casais com ou sem filhos eram chefiados por mulheres. Nem sempre é uma questão de escolha, mas quando preciso, encaramos a nova realidade que de alguma forma, se estabeleceu na sociedade.

D
urante muitos e muitos anos ficamos deste lado do rio, esperando que um homem forte e gentil nos ajudasse a atravessar. Só que isso não aconteceu. E assim, construímos um pedaço significativo da História da humanidade, através da nossa luta e da coragem de enfrentar desafios, paradigmas e tabus.

A
inda apreciamos que nos abram a porta do carro, que carreguem nossas compras, que paguem a conta do jantar. Porém, não permitimos mais que estas atitudes nos tornem dependentes ou submissas. Com uma boa parcela de exceções, é claro, hoje sabemos o que queremos e o que devemos fazer para chegar lá.

Q
uando você se sentir terrivelmente tentada a se debruçar sobre um problema e desistir lembre-se: nada define melhor uma mulher do que a sua força. Em algum lugar do seu coração existe uma rocha que não se despedaça por qualquer intempérie e que a ajudará a manter-se em pé, quando tudo o mais estiver desmoronando. É um excelente pensamento para começar um novo ano, que está quase aí e quem sabe até, uma nova vida.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Escolhendo bons pais


Às vésperas de ser mãe, se pensa em muita coisa. Chego a concluir que sempre que surge um filho, surge uma nova neurose. Porque passam coisas pela cabeça que nunca haviam passado antes. Mas pensar é bom, refletir, melhor ainda.
E
aí, no meio de uma dessas reflexões, fiquei a par de um antigo ditado canadense que diz: “quando o pai falta, o filho manca”. E tive um pouco de náusea. Não enjoo, daqueles terríveis do início da gravidez. Náusea mesmo, como se estivesse em uma roda gigante de alta velocidade.

P
orque isso significa, que não importa quão boa mãe você seja, o quanto você se esforce e quantas medalhas de honra ao mérito ganhe pela educação de seus filhos. Se faltar o pai, sempre faltará alguma coisa. E então lembro que isso não depende apenas da gente. Depende deles e das decisões que tomam.

Hoje em dia é comum ouvir histórias sobre mães que abandonam os filhos, que os rejeitam ou que são negligentes na sua criação. Mas graças a Deus, isso ainda é exceção. A grande maioria das mães é devotada à criação dos filhos, trabalhando com o que têm de melhor para oferecer a eles. Mas sempre existiu e cada dia mais, ouve-se histórias de pais que abandonaram seus filhos. Parece ser mais simples para eles. Não carregam nada, apenas escolhem não participar e vão embora. Como se virar a esquina os livrasse daquela obrigação.
E então muitas mulheres são obrigadas a ser mães e pais. Quer dizer, se obrigam a tentar, porque por mais triste que seja a constatação, elas jamais conseguem. Há inúmeros estudos da psicologia sobre as consequências da ausência do pai, especialmente nos primeiros anos de vida da criança. E todos eles apresentam um prognóstico ruim para elas. Isso é assustador.
Em uma sociedade regida pelos princípios da competitividade e da relatividade é cada vez mais fácil produzir um filho e depois abandoná-lo. E as justificativas são inúmeras também. “Não quero mais o casamento, mas serei responsável pela criança”. Que tipo de responsabilidade é essa? Como alguém pode ser participante ativo da vida do filho, sem estar presente? Virtualmente? Ora, por favor. A virtualidade é sinal de progresso, mas não pode substituir a presença de alguém tão vital para o desenvolvimento infantil.
A
penas para citar uma destas inúmeras pesquisas, li uma bastante completa, feita por dois psiquiatras gaúchos, David Bergmann e Marian Eizirik, chamada “Ausência paterna e sua repercussão na vida da criança e do adolescente”. Entre outros autores, citam o artigo “Da proteção generosa à vítima do vazio” para apoiar suas descobertas. “Segundo Muza, crianças que não convivem com o pai acabam tendo problemas de identificação sexual, dificuldades de reconhecer limites e de aprender regras de convivência social. Isso mostraria a 'dificuldade de internalização de um pai simbólico, capaz de representar a instância moral do indivíduo'. Tal falta pode se manifestar de diversas maneiras, entre elas uma maior propensão para o envolvimento com a delinquência”.

Ainda na mesma pesquisa, os autores citam o artigo “A função paterna no desenvolvimento do bebê”. “... a função paterna é fundamental para o desenvolvimento do bebê. Segundo os autores, tal função é dinâmica, já que o pai representa um sustentáculo afetivo para a mãe interagir com seu bebê e também, ainda nos primeiros anos da criança, deve funcionar como um fator de divisão da relação simbiótica mãe-bebê”.
Apenas estas duas conclusões seriam suficientes para sustentar a ideia de que a ausência do pai é catastrófica para o desenvolvimento infantil. Mas não é só isso. Há números e dados que demonstram essa realidade e há a vida diária, com seus milhares de exemplos de como um filho reage à falta do pai. Tristíssimo.
É por isso que nunca foi tão urgente em nossa sociedade, a necessidade de se manter a família unida. De se lutar pela preservação da presença do pai. De se fazer escolhas que sejam acertadas, ainda que sacrifiquem os próprios anseios, já que eles sempre devem ser relegados a segundo plano, quando uma vida está em jogo. Nossas justificativas egoístas e fúteis sempre se tornam discursos vazios, quando o que queremos justificar é um erro indesculpável.
P
or isso mães, não depende só de nós, infelizmente, mas depende muito de nossas escolhas também. Mesmo que você possa se enganar, achando que fez uma boa escolha, não custa nada checar sempre para ter a certeza de que aquele é o melhor pai, para a melhor coisa que já aconteceu em sua vida.

domingo, 18 de setembro de 2011

Nunca é demais

Já usei este espaço algumas vezes para falar sobre a violência contra a mulher. Mas parece que nunca é demais. A cada ano as estatísticas só aumentam e como não se sabe onde tudo isso vai parar, o jeito é discutir o assunto até que ele chegue pelo menos perto do esgotamento.
U
ma pesquisa divulgada no início deste ano pela Fundação Perseu Abramo aponta que 91% dos homens considera errado bater em mulher, seja qual for a situação. Mesmo assim, uma em cada cinco mulheres entrevistadas afirma já ter sofrido algum tipo de agressão, por parte de conhecidos ou desconhecidos. E uma em cada dez mulheres diz já ter sido espancada alguma vez na vida. Isso em números, mostra que a cada dois minutos, cinco mulheres sofrem violência no Brasil.

I
sso nos choca, nos deixa alarmados, nos surpreende. E só. Quando ocorre no vizinho, com alguém da família ou mesmo dentro de nossa casa, em muitos casos, fechamos os olhos e calamos. Aquele velho e ridículo ditado “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”, ajuda a ceifar inúmeras vidas, precocemente.

E
ssa violência contabilizada pela pesquisa é aquela que deixa marcas roxas pelo corpo. É aquela que se pode ver e que, consequentemente, escandaliza mais. Mas ainda há aquela violência velada, disfarçada, que é como um pequeno câncer a corroer a vida. Essa pode ser ainda mais cruel, porque a vítima, muitas vezes, demora a perceber que ela ocorre.

M
uitos companheiros conseguem inverter situações de discussão para parecer que a mulher é sempre culpada. Não é incomum ouvir, no relato destas vítimas, frases como: “se eu tivesse me comportado melhor, se eu tivesse feito o jantar, se eu tivesse ficado calada, se eu fosse mais inteligente, mais bonita”, e por aí vai.

E
stes agressores têm a capacidade de implantar pequenos explosivos na autoestima feminina. E aquele campo minado, aos poucos vai se deteriorando até que não sobre dignidade alguma para reagir. Trata-se de simples gestos do dia a dia, como a falta de diálogo, a falta de carinho, a falta de elogios, de incentivo, de amor. Aquele homem quer permanecer com aquela mulher, apenas para poder subjugá-la, sem no entanto, nutri-la com a quantidade necessária de afeto para que ela sobreviva.

Você pode pensar que isso não é violência, que é um exagero. Mas pare e pense em quantas mulheres você conhece cuja vida é norteada apenas pela ação mecânica de acordar, trabalhar, fazer coisas para os outros, dormir e assim, consecutivamente. Onde está aquele brilho nos olhos que a infância revelava nas brincadeiras de casinha, quando tudo o que se imaginava do futuro envolvia um homem maravilhoso e profundamente apaixonado?
Q
uando se convive com um agressor emocional, as palavras ditas e as não ditas, tornam-se como tapas, socos, pontapés e finalmente, tiros e facadas. Pode durar uma vida toda. Pode passar despercebido pela sociedade, especialmente nas classes sociais mais elevadas. Mas um dia, alguma coisa acontece e muda tudo. E geralmente, não é para melhor.
Se você sofre este ou algum outro tipo de agressão, ou se conhece alguém que sofre, não fique calada. Não permita que sua vida ou de outras pessoas seja destruída porque alguém não entendeu seu papel neste mundo como ser humano. Não deixe que as coisas boas que há na vida fiquem tão difusas que você já não saiba mais a diferença entre viver e apenas existir.
Queremos falar sobre coisas melhores e discutir assuntos mais leves. Mas enquanto esse dia não chega, nunca é demais falar.

domingo, 14 de agosto de 2011

Chegadas e partidas

A apresentadora Astrid Fontenelle tem um programa no canal GNT que se chama Chegadas e Partidas. Ela apresenta o programa diretamente de um aeroporto, o local mais propício para chegadas e partidas diárias. Ali, ela entrevista pessoas que estão indo para algum lugar, a passeio ou definitivamente, bem como pessoas que estão voltando, nas mesmas condições. Muitas vezes, ela se emociona com os relatos de histórias de vida, que culminam com o ambiente do aeroporto, sempre inconstante, sempre passageiro, nunca estático.
O
nome do programa e algumas histórias me fizeram pensar no assunto, não por acaso. No último mês estou experimentando a readaptação a uma cidade pequena. E não só isso. A uma vida pequena. Não literalmente, mas pequena, no sentido de simples, menor. E isso poderia representar uma catástrofe na vida de alguém mais cosmopolita e urbano. Mas para mim, nada é mais recompensador do que abrir a janela e me deparar com uma paisagem technicolor – céu azul, planície verde, plantação amarela – com o perdão da pieguice.

E
m minha partida trouxe pouquíssima coisa na mala. E nem por isso ela estava leve. Carinho dos amigos, boas lembranças, o aprendizado de viver em uma cidade que não para, a expectativa de voltar a morar, tantos anos depois, na mesma rua onde passei parte da minha infância e quase toda adolescência. É uma bagagem e tanto, quase paguei excesso de peso!
E pensando sobre estas coisas, me deparei com a realidade de um sem número de mulheres. Homens também. Mas preciso ser fiel às minhas leitoras! Por isso pensei nelas. E em como é difícil lidar, na vida diária, com tantas chegadas e partidas.
Precisamos enfrentar as partidas literais – pessoas queridas que morrem, filhos que vão morar longe, amigos que nunca mais encontramos, mudanças de cidade, estado, país. E também com as partidas emocionais – pessoas que estão ali, mas que deixaram de nos amar, a beleza que vai embora, os anos que não voltam mais. É bastante coisa para se pensar.
E ainda temos que lidar com as chegadas. Ah, as chegadas são tão melhores! E mesmo assim, nos causam estranheza. Um novo filho, que não sabemos em que tipo de mundo será recebido, um novo amor, que não sabemos se ficará para sempre, um novo emprego, que nem imaginamos quanto exigirá de nós, uma nova condição de vida, que nos torna aprendizes outra vez.
E
assim seguimos a vida, permeada de chegadas e partidas. Nem bem desfazemos uma mala, já estamos arrumando outra. Para algumas de nós, a vida parece mesmo um eterno acampamento, já que nunca conseguimos, de fato, encontrar um lugar onde valesse à pena esvaziar a bagagem.

P
or isso amiga leitora, e por ventura, algum leitor simpatizante, meu humilde conselho é: não tenha medo das chegadas e partidas. Aceite as partidas com a mesma serenidade que aceita as chegadas. E creia que as mudanças, por piores que pareçam, nem sempre são de todo ruins. Você pode pensar que é filosofia de para-choque de caminhão, mas na verdade é a maneira mais digna de se enfrentar o trânsito intenso da vida.

Q
uando partir, escolha com sabedoria o que colocar na mala. Não carregue ressentimentos, inimizades, lembranças tristes, preocupações e uma lista enorme de coisas a fazer. Quanto mais simples for a sua vida, mais você encontra tempo para o que é essencial. E quando chegar, certifique-se de estar preparada para o novo, sem contudo, deixar de surpreender-se com as pequenas coisas. A vida é desinteressante para quem tem expectativas demais, mas pode ser assustadora para quem nunca espera nada dela.
Depois de tirar tudo da mala e encontrar um lugar adequado para cada coisa, passe um pano úmido nela e deixe secar ao sol. De vez em quando, tire ela do armário e deixe arejar por algumas horas. Você nunca sabe quando terá que partir de novo. E mais do que isso: desejo que você jamais se acostume com uma vida medíocre, onde nunca há chegadas e partidas. Muito mais vale contar os anos através dos bilhetes de passagem que compramos, do que passar a vida sentados num banco de aeroporto.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Incompreensível

Faz dias que não escrevo. Descobri que além de enjoar de cheiros e de comidas, grávidas também podem enjoar de tarefas, como escrever, por exemplo. Mas, tudo bem. Um pequeno sacrifício para um grande prêmio!
O fato é que como mulheres passamos a vida escutando coisas sobre o que acontece quando engravidamos. Falam sobre os desejos, os mal-estares, os sentidos aguçados, as primeiras sensações de tudo, a mudança de perspectiva. E, se você é como eu, a maioria destas coisas sempre pareceu um tanto absurda. Exagero.
Mas tenho experimentado essa experiência e cheguei à conclusão de que elas tinham razão em tudo. A sensação de carregar alguém não é apenas estranha e maravilhosa, mas parece, acima de tudo, sobrenatural. É uma espécie de conexão incrível com a realidade, como se antes disso tudo tivesse sido permeado de momentos reais e momentos imaginários.
E explicando assim, pode parecer difícil de entender, mas não é tanto. Conexão com a realidade é a forma mais simples de explicar. Foi fazendo meu primeiro ultrassom que eu cheguei a esta conclusão. A sensação é surreal, mas a vida pareceu mais real do que nunca.
E no meio destes pensamentos, por um momento me ocorreu a seguinte pergunta: como uma mulher consegue carregar alguém dentro de si por nove meses e depois jogar numa lata de lixo, numa sarjeta, num rio? O que antes parecia apenas cruel, hoje parece incompreensível.
A única explicação que me ajuda a ter um vislumbre de resposta é que estas mulheres não têm conexão alguma com a realidade. Por algum motivo, seja qual for, aquela sensação de estar ligada a alguém por um laço que não é apenas imaginário, mas que realmente existe, não acontece para elas. Não justifica, pois há mães que sofrem traumas e problemas e nem por isso abandonam os filhos. Mas ajuda a explicar.
Porque é realmente difícil de entender que alguém escute aquele coraçãozinho disparado bater retumbante, veja aqueles movimentos, como se estivesse acenando e não sinta que sua vida está eternamente ligada àquela pessoa e que, portanto, jogá-lo fora é também lançar mão de uma parte de si. É incompreensível.
É incompreensível também, porque existem centenas de pessoas em cada cidade aguardando em uma interminável fila para adotar uma criança. Ora, mesmo sendo estranhamente absurdo uma mãe não querer o filho, a primeira opção deveria ser dá-lo a alguém que o deseja muito, antes mesmo de conhecê-lo.
Nossa sociedade é ambígua em tantos sentidos que favorecem esse tipo de atitude, que quase não é possível enumerá-los. Apenas para se ter um vislumbre, podemos falar sobre como as campanhas de controle de natalidade são ineficazes, enquanto o apelo midiático ao sexo irresponsável é certeiro.
Se abrir mão dos filhos de forma violenta (como abandonar recém nascidos na calçada) se tornou uma prática comum em nosso País, será que não está na hora de discutir uma política pública que contemple essas pequenas criaturas incapazes de se defender? Essa demora dos governos em tocar no assunto é no mínimo, incompreensível.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Guarde para você


Há tempo quero escrever sobre algo que me incomoda muito em nossa sociedade, mas não sei bem por onde começar. Tem certas coisas hoje em dia, que parecem “incriticáveis”. E falar sobre estas coisas de maneira negativa, faz com que as pessoas pensem em você como alguém retrógrado, como se valores tivessem prazo de validade.
Mas eu vou falar. Não tenho medo de rótulos que me definam como ultrapassada. Tenho medo sim, de ser omissa e um dia criar filhos que tenham vergonha de assumir seus valores, porque não conseguem viver com isso. Eu prefiro me encaixar em algum lugar de um passado bem distante, do que viver em um presente onde nada na vida tem realmente um propósito.
A questão é: detesto pessoas que vão à mídia falar sobre sua vida sexual. Mais especificamente, tenho vergonha de mulheres que falam sobre suas intimidades para a imprensa, a fim de causar polêmica. Explico. Primeiro, porque não acredito nelas. Eu não estava lá (graças a Deus!) e, portanto, nunca saberei se disseram a verdade. E segundo, porque tenho a nítida impressão de que falam sobre estas coisas, apenas para criar uma imagem sexy de si mesmas, para se vender aos programas de televisão, revistas e campanhas publicitárias. Puro marketing.
O bombardeio de informações ocasionado principalmente, pelo boom tecnológico que faz parte da vida cotidiana do nosso século, preenche cada minúsculo espaço destinado ao raciocínio, em nosso cérebro. Uma pesquisa sobre o volume de informações que uma pessoa recebe durante a sua vida, feita em 2008 (olha que já faz tempo!) nos Estados Unidos, constatou que cada pessoa recebe informação equivalente a 174 jornais, por dia. Se cada um desses jornais fosse vendido a um dólar, seria necessário mais do que a soma mundial de todos os PIB’s (Produto Interno Bruto) para comprá-los. Com toda a informação produzida em um ano, seria possível forrar todo o território da China com 13 camadas de livros. A quantidade representa 80 vezes mais informação por pessoa, do que armazenava a histórica Biblioteca de Alexandria, em seu tempo (século 3 a.C.).
Diante desta realidade, que impacto você acha que causa em uma pessoa - particularmente se for homem e casado - informações do tipo?: “se você não enviar fotos nua ao seu namorado, então eu me sinto mal por ele”; “já explorei obsessão e fetiches sexuais estranhos’; “não faço sexo casual, mas não julgo mulheres que fazem, homens fazem isso o tempo todo”; “para uma noite quente, eu uso um casaco com nada embaixo”; “é claro que sou boa na cama, meu marido diz isso e tem muita experiência nessa área”; “eu não sou contrária a ser amarrada com lenços de seda”; “gosto de sair de casa sem calcinha”.
Estas são algumas frases, as menos agressivas, que coletei durante algum tempo, de “notícias” da internet. Elas estão espalhadas por aí, em páginas e mais páginas do mundo virtual, se infiltrando na mente das pessoas, se tornando corriqueiras e dizendo claramente a quem quiser ouvir: se você não for assim, desta forma, não é boa o suficiente para o seu marido. Estas frases, que geralmente estão fora de um contexto são pequenos passarinhos fazendo um ninho pernicioso no imaginário masculino.
E então estes homens voltam de seus escritórios para casa, depois de um dia inteiro em contato com frases e informações estimulantes e se deparam com mulheres normais, reais, que têm suas inseguranças em relação ao corpo, que trabalham em jornada dupla, que não tem acesso aos recursos financeiros que levam as atrizes e as celebridades a investirem fortunas em sua beleza e que se dedicam a fazer do lar, mais do que apenas um lugar onde se pode fazer sexo livremente. Que tipo de frustração você imagina que isso causa na cabeça destes homens? Já parou para pensar nisso ou acha que é exagero?
É claro que não há nada de errado com muitas das intimidades expostas por estas mulheres. Cada casal é responsável por aquilo que faz entre quatro paredes. O problema é justamente esse: deveria permanecer entre quatro paredes. Não é útil à vida de ninguém. Não há proveito algum para qualquer pessoa, saber o que a outra faz ou deixa de fazer com o seu parceiro.
Por isso, seria muito bom que cada qual guardasse para si aquilo que não diz respeito aos outros. Se querem vender uma boa imagem de si mesmas, que façam alguma coisa realmente útil à humanidade. Em alguns anos, quem sabe até décadas, a maioria destas mulheres terá sido esquecida tanto pela mídia, quanto pelas próximas gerações. Mas quem se dedica a fazer de sua vida um verdadeiro marco da existência, permanece na História eternamente.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

A importância da mãe



Já é de praxe da publicidade em geral, comemorar massivamente o dia das mães neste mês de maio. Estamos acostumados. Levamos automaticamente a questão para o lado dos presentes e lembrancinhas. Mas a data merece uma reflexão mais ampla.
Minha geração reclama muito dos pais e das mães, porque talvez tenha sido a primeira permitida a fazer isso. Reclama que foram autoritárias, insensíveis, exigentes, que se esqueceram de quando eram jovens. E elas sempre dizem: um dia você vai ser mãe, vai entender o que estou dizendo. Nem chega a tanto. Quando se cresce um pouco mais e se tem uma carga maior de responsabilidade, nem é preciso ter filhos para compreender os erros cometidos pelos pais.
Uma das minhas lembranças mais queridas da infância envolve uma boneca chamada “roqueira”. Não se fabrica mais, mas ela era muito engraçada. O corpo dela era todo maleável, o cabelo era de lã azul e ela tinha velcro nas mãos, o que permitia que fosse colocada em diferentes posições. Eu tinha quatro anos e fui passar uns dias na casa de uma tia, em outra cidade. Quando voltei, a “roqueira” estava sentada na minha cama, de pernas cruzadas, com as mãos juntas sobre os joelhos e com certeza, minha mãe é que tinha “brincado” com ela. Eu era muito pequena, mas até hoje me lembro da sensação de “a minha mãe sentiu a minha falta”.
Outra coisa de que me lembro com saudade é que quando chegava perto da hora de dormir ou quando eu estava triste ou brava, minha mãe sentava na cama em “posição de índio” e me colocava naquele vão entre o tronco e as pernas. Ela dizia “vem para o meinho”. E ali no “meinho” a vida era um pouco mais fácil. Hoje em dia, quando as coisas se complicam, eu penso em como seria bom ainda caber no “meinho”, para que a vida se tornasse, outra vez, um pouco mais fácil. Mas, além de não caber mais ali, minha mãe também está a mil quilômetros de distância, então, não tem jeito mesmo.
Estas coisas me fazem pensar sobre a importância da mãe para o desenvolvimento do ser humano. Muitos dos monstros cruéis que tiram vidas sem piedade são pessoas que não tiveram mãe ou que tiveram uma relação complicada com ela. A mãe é alguém que, por mais que cometa erros ensina a pessoa a ser humana. É ela quem apresenta o mundo ao pequeno ser e mostra a ele como viver em sociedade. Caso ela falhe neste sentido, ele talvez nunca seja sociável. Mas em alguma coisa elas sempre acertam, ou então não haveria tantas pessoas boas no mundo, para fazer contraponto às que são más.
Diariamente a vida de milhares de mães ao redor do mundo é mutilada pela perda de filhos de maneira brutal. Impossível não lembrar nesta hora das mães de Realengo, no Rio de Janeiro, que no mês passado tiveram os filhos arrancados de seu convívio por um psicótico, cuja mãe biológica sofria de esquizofrenia, enquanto era viva. Estas mães, de braços vazios, jamais terão suas feridas curadas, embora talvez um dia, elas parem se sangrar.
Como estas há tantas e tantas mães com histórias tristes, de filhos mortos pelo tráfico, pela violência urbana, no trânsito e doméstica, pela fatalidade, pela doença, pela depressão, pelos motivos mais diversos. Para estas, a data será de dor e talvez, ao encontrarem o conforto no abraço de outros filhos, no carinho dos amigos ou na fé, tenham a tristeza amenizada.
Para as demais, que a data seja alegre, comemorativa e intensa, afinal, ser mãe é certamente um dos maiores privilégios concedidos às mulheres. Quem nos criou certamente sabia que a vida não seria nada fácil, com tantos afazeres, exigências, com tanta exploração e desvirtuação de valores. E quem sabe por isso, nos deu esta tarefa intransferível de conceber a vida como presente supremo da existência. Como filhas e como mães é nosso dever aproveitar a data ao máximo. Então, aproveite!

sexta-feira, 29 de abril de 2011

O casamento real e os brasileiros que tropeçam na língua




O dia 29 de abril de 2011 certamente será um dos mais documentados da História. O olhar do mundo todo se voltou para a Inglaterra, onde o príncipe William se uniu à plebeia Kate, em uma cerimônia acompanhada por 1.900 convidados presentes e outros milhões de espectadores virtuais.
Nas rodas de conversas tupiniquins do dia, acompanhei muita coisa sendo dita e pouco proveito tirei. Foi um dia mesmo para morder a língua e calar. Descobri que a ignorância me irrita menos do que a pseudo-sabedoria e o discurso dos teórico-socialistas.
É uma ironia sem precedentes, os brasileiros criticarem o casamento real, sob o argumento do dispêndio de dinheiro popular. Primeiro, porque a Inglaterra é um país de primeiro mundo, por isso, não há um contraste tão grande entre a pompa do casamento mais esperado dos últimos anos e a camada financeiramente menos favorecida da população. Já por aqui, onde sediaremos uma Copa do mundo, que não temos condições financeiras de sediar, quando os jogadores estiverem pisando em gramados que mais tarde serão usados apenas esporadicamente, haverá crianças passando fome e pessoas morrendo por causa da falta de condições básicas de sobrevivência.
Outro ponto a ser analisado é que talvez, eles também olhem para nós e fiquem pasmos da mesma forma, com respeito ao carnaval. Só que casamentos reais acontecem de vez em quando e o carnaval brasileiro todos os anos suga milhares de reais dos cofres públicos, para bancar uma festa que não serve apenas para atrair turistas e divulgar a cultura brasileira, como tanto se gosta de alardear por aí. Carnaval também é sinônimo de violência, promiscuidade, incentivo ao uso de drogas e abuso de álcool, dentre outras centenas de frivolidades e nem por isso, o mundo se escora na soleira da janela para falar mal das nossas tradições.
E se não bastasse tudo isso, o simples fato de quem eles têm uma cultura diferente da nossa já seria suficiente para simplesmente respeitarmos as decisões que tomam, uma vez que elas não ferem nenhum dos princípios de paz entre as nações. A Inglaterra vive sob o regime monárquico, portanto, nada mais correto do que cultivar as tradições pertinentes a ele.
Além de tudo isso foi um dia feliz para o povo inglês. Todos saíram às ruas, organizados e civilizados como são, para prestigiar o novo casal real. A monarquia mudou e os súditos fazem isso por respeito e admiração e não por obrigação, como foi no passado.
Nosso mundo já está bastante cheio de desgraças cotidianas e estamos fartos de falar sobre elas. É necessário conscientizar as pessoas sobre o desperdício do dinheiro? Sim, é. Mas estamos escolhendo muito mal nossos governantes para dar palpite em como os outros países são administrados. Precisamos mesmo é encarar o grande espelho da nossa realidade, cuja desigualdade social é horrenda.
Que o belíssimo casamento de William e Kate nos faça refletir sobre a importância do matrimônio, seja ele celebrado com títulos, coroas e requintes, ou na mais simples capela, do local mais distante e solitário. Que o amor deles dure verdadeiramente e que vá além do que nossos olhos admirados puderam ver. Isto, brasileiros e brasileiras, são verdadeiros votos de felicidade.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Novos tempos

Não tenho conta no Twitter, Facebook, Orkut (já tive e ouvi dizer que agora é coisa do passado) e em nenhuma outra rede social. Minha única conexão com o mundo virtual é este blog. Veja bem: não me orgulho disso. Conheço as necessidades reais de se acompanhar o tempo e suas rápidas mudanças e sei que fico a léguas de distância daqueles que se conectam com maior facilidade. Mas ainda não encontrei um meio de organizar meu tempo onde isso se encaixe. Eu quero mesmo é diminuir as tarefas, para sobrar mais tempo para o que é essencial. E um “bichinho virtual” para cuidar não me ajudaria nisso. Hoje, mas espero que isso mude, logo.

Enfim, estou refletindo sobre essas mutações tecnológicas tão rápidas. Conheci a internet quando fui para a faculdade. Minha amiga Vivi criou uma conta de e-mail para mim, que utilizo até hoje. Eu morava em regime de internato, então outras três garotas dividiam o quarto comigo. Ninguém tinha celular. A televisão ficava em um centro de entretenimento, junto com uma sala de jogos de mesa. Se eu quisesse assistir telejornais, tinha que ir até lá. Eu não tinha computador pessoal e a faculdade ficava em uma fazenda a 15 km de distância da cidade mais próxima. Meus trabalhos eram entregues em disquete. Muitos eram feitos à mão, mesmo. Faz sete anos que me formei. Outro dia li uma troca de recados entre duas pessoas que moram e estudam lá atualmente, dizendo assim: “meu pendrive precisa visitar o seu MacBook para saber das novidades”. Sete anos é tanto tempo assim? Fiquei quase chocada.

O fato é que as coisas acontecem de maneira muito rápida, verdadeiramente. E isso é bom, mas pode ser ruim, para quem tem dificuldade de acompanhar o tempo. Algumas pessoas aceitam com maior facilidade, outras adoecem porque não conseguem absorver a demanda de tempo exigida, ironicamente, pela tecnologia. Era para a tecnologia facilitar a vida, mas para quem não sabe usar, ela apenas preenche pequenos espaços de tempo, até que “pessoa ocupada” vira sinônimo de “pessoa moderna”.

Mês passado o Japão sofreu um terremoto seguido de tsunami de proporções catastróficas. As pessoas não ficaram sabendo – elas viram em tempo real, transmitido pela televisão, ou via internet, por computadores, celulares ou tablets. Há apenas 10 anos isso seria quase impensável. Existia um caminho para que a notícia fosse exibida: pauta/produção/decupagem/edição/exibição. Hoje isso é praticamente arcaico. As pessoas fazem notícia pelas redes sociais em tempo real, sem intermediários. O papel do jornalista é muito mais interpretativo do que demonstrativo, porque quase todo mundo já sabe o que aconteceu, eles apenas querem saber o que você pensa sobre isso e qual é a sua maneira de se conectar à realidade.

Isso dificulta bastante a profissão, já que precisamos nos reciclar diariamente. Mas facilita bastante no tocante às fontes. Há fontes saltando da tela o tempo todo e isso enriquece as reportagens, as crônicas, os artigos. A informação nunca foi tão acessível, resta saber selecionar e aí podemos ter sérios problemas.

De qualquer forma, as mudanças estão aí e o que se pode fazer é tirar o melhor proveito delas, para que nos sirvam e não precisemos servi-las. Os verdadeiros sábios tecnológicos são aqueles capazes de viver sem a tecnologia, caso ela falte. E tomara que isso não aconteça, ou deixarei de existir virtualmente. Contraditório não? Nem tanto. Demandas de novos tempos.

quinta-feira, 31 de março de 2011

O grande Deus das pequenas coisas




Há pessoas que acreditam que Deus não intervém nas pequenas coisas do homem e nem que se revela através da prática religiosa. Acreditam que Deus pode ser encontrado somente através da razão. São os deístas. Há também quem acredite que Deus se manifesta apenas nas grandes oportunidades, nos milagres populares, como a cura e o livramento da morte. São os da turma de Tomé, que precisava ver para crer.
Sempre imaginei Deus como um ser coletivo, que se manifesta de maneira coletiva e que se dá a conhecer através da pluralidade. Sei que Ele é um Deus pessoal e que se preocupa com as mínimas coisas, porque em minha vida há uma imensidão de pequenas coisas feitas por Deus, escondidas entre aquelas que são maiores. Mas, por algum motivo, por algum tempo, imaginei Deus como alguém muito ocupado. Talvez ocupado demais para mim. Então passei a pedir a Deus que me fizesse voltar a entender o quanto Ele é meu Pai, mesmo tendo tantos filhos, tão amados quanto eu sou. Não pedi exemplos ou demonstrações. Pedi apenas a sensação. Pedi apenas que Ele me dissesse, de alguma maneira audível, o quanto isso é um fato, uma realidade. Sei que não preciso dizer a Deus como fazer as coisas, então apenas pedi e esperei.
Durante a espera, que não foi longa, mas muito dolorosa, como muitas outras são, aconteceram várias coisas difíceis de lidar, querendo me mostrar o contrário daquilo que estava pedindo – "Deus está muito ocupado" – voltei a pensar. E o sentimento de querer reduzir Deus, que é tão grande e poderoso a uma característica tão humana, que é o excesso de trabalho é ainda pior do que senti-Lo distante. "Deus nunca está ocupado demais para você": racionalizei dias a fio.
Em meio à minha espera, didática e reveladora, um dia, assim, como em outro qualquer, eu senti que Deus estava agindo particularmente em minha vida, permitindo as coisas que não são tão boas, para que eu saiba que Ele espera mais de mim do que tenho oferecido. Deus é aquele Pai que se senta com seu pequeno filho para desenhar e que mesmo tentado a pegar na frágil mãozinha e terminar de uma vez os traços sofríveis, para que alguma beleza apareça, enfim, no papel, apenas observa. Se o filho pedir, Ele vai intervir e ajudar, mas jamais completará o desenho do filho, porque Deus deseja ardentemente que ele seja capaz de fazer isso sozinho e finalmente, aprenda.
Então, quando, depois de dias e dias refletindo, cheguei a esta conclusão, Deus achou que era a hora de exemplificar. Porque o processo educativo é reflexivo, mas também é prático. Tenho tendinite no braço direito. Às vezes ela aparece para me mostrar os efeitos de uma profissão que faz uma pessoa ficar sentada em frente ao computador, oito horas por dia, cinco dias por semana. Moro na cidade de São Paulo, onde o Sistema Único de Saúde é caótico e não tenho plano de saúde. Da última vez que tive tendinite há anos, estava no Rio Grande do Sul onde meu plano de saúde funciona. Fui atendida, medicada e ganhei alguns dias de descanso, porque a melhor solução para a tendinite é interromper o esforço repetitivo.
Quando a crise começou, há alguns dias, fiquei bastante preocupada, porque sem um atestado médico, eu não poderia parar de digitar, que é basicamente o que faço o dia inteiro. A dor foi aumentando. Uma bola surgiu no músculo, logo atrás do ombro. Não acho posição para dormir. Os dedos no teclado fazem a bola quase querer quicar. Cheguei a pensar no absurdo de ir a um hospital público. Quem conhece São Paulo sabe por que isso seria um absurdo. Mas a confiança adquirida nos dias de provação me fez acreditar que alguma solução inesperada surgiria. E ela surgiu.
O departamento de Recursos Humanos da empresa onde trabalho me chamou para dizer que descobriram em meus registros, nove dias de férias pendentes, a serem tirados imediatamente. Esses dias são referentes ao ano de 2009. E eles descobriram apenas agora, justamente no momento em que eu mais precisava. Tentei não esboçar nenhuma reação anormal, mas minha vontade era de chorar. Chorar de emoção, como a criança que recebe o seu primeiro diploma. Enfim, se completa um ciclo de aprendizagem.
Por esta e por inúmeras experiências sei que Deus é pessoal. Sei que Ele se preocupa com coisas que nem eu mesma dou a devida importância. Sei também, que possivelmente, esta não será a última vez que precisarei que Ele me lembre disto. Mas me sinto feliz e aliviada, por saber que mesmo em um mundo tão populoso, tão cheio de catástrofes, onde pessoas sofrem tragédias pessoais ou coletivas a todo instante, Deus tem tempo para minha tendinite. Empiricamente (mesmo que não fosse necessário) eu sei que Ele é o grande Deus das pequenas coisas.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Apaixonadamente

Há muitas maneiras de ser militante do feminismo. Se você encara o feminismo como um movimento que luta pelos direitos das mulheres, então você é uma pessoa equilibrada e merece assistir a este vídeo. Se por outro lado, você é daquelas pessoas que se tornou feminista para combater o machismo e acabou se tornando pior do que os militantes daquele, você precisa ver este vídeo. É longo, mas cada palavra vale à pena. (Bem embaixo dele, em view subtitles, você pode escolher a legenda em português).


quarta-feira, 16 de março de 2011

A fidelidade é a chave e não a fechadura

Procurando algo interessante para assistir na televisão, me deparei com uma entrevista feita pela apresentadora Marília Gabriela em seu programa homônimo no canal GNT. A entrevistada era uma psicanalista cujo nome me recuso a citar, pelo simples fato de que as ideias dela não merecem publicidade.
Ela estava lá falando sobre relacionamentos e segundo ela, o problema do casamento é a ilusão do amor romântico. Até aí posso concordar. Muitos casamentos não dão certo porque as pessoas entram neles com uma elevada expectativa de que a paixão será contínua e em grande parte, a rotina demonstra outra realidade. Mas o que me chocou é que ela prosseguiu dizendo que a exclusividade dentro do casamento é uma ilusão e que se a pessoa amada preenche suas necessidades enquanto está com você, o que ela faz depois disto é problema dela e não seu.
Além de chocada fiquei revoltada, porque uma criatura destas consegue vender suas ideias, em um mundo de pessoas cada vez mais perdidas em seus relacionamentos e formas de encarar a vida. Vivemos no século da relatividade. Os valores que servem para mim, não são os mesmos que servem para esta psicanalista. Mas afirmar com propriedade que os casamentos funcionariam melhor se as pessoas não exigissem exclusividade, com certeza, está entre as piores coisas que já ouvi.
E isso não é uma grande mentira apenas porque o casamento é um plano de Deus e por isso não pode ser relativizado e enquadrado em uma mentalidade tão deturpada. É mentira também, porque nenhum relacionamento que pressuponha respeito como qualidade indispensável para fluir com estabilidade pode admitir a infidelidade. A traição não é simplesmente a abertura do relacionamento para a entrada de outras pessoas. Ela é uma ferida aberta no vínculo de amizade entre o casal. E quando aberta ela sangra por muito tempo ou talvez, nem mesmo chegue a cicatrizar.
Eu desejei estar sentada na cadeira da Gabi por um minuto. Gostaria de olhar nos olhos daquela mulher e pedir para que ela dissesse isso a alguém cuja família foi destruída por um ato impensado ou mesmo por alguém que usou a sua liberdade de maneira irresponsável. Gostaria que ela dissesse isso a uma criança que viu a mãe ser morta por em um ato violento motivado pelo ciúme ou que teve que dizer adeus ao pai que a colocava na cama à noite para dormir. Gostaria que ela fosse capaz de explicar a sua “brilhante” teoria a alguém que mostrou o melhor de si para outra pessoa e que, por causa de uma traição, sentiu que tudo o que tinha não era bom o suficiente para o ser amado.
O casamento não é uma instituição falida. A família sempre será a célula mais importante da sociedade. E a sociedade está se destruindo justamente porque não percebe a gravidade disto. Um pensamento como este que a psicanalista incute através de seus livros e entrevistas é uma poeira tóxica pairando sobre nossas cabeças. A ideia de que o casamento só poderá ser realmente feliz quando ambos fizerem o que quiserem quando não estiverem juntos é uma das maiores mentiras que se pode pregar irresponsavelmente por aí.
Duas pessoas que incluem em sua suposição de amor a cláusula da não exclusividade, jamais experimentarão a verdadeira liberdade que só pode acontecer quando a mente e o coração, em sintonia, escolhem o que é melhor para ambos. Liberdade é poder escolher conscientemente dedicar-se inteiramente a uma pessoa, mesmo tendo a opção de sair com outras. A utopia do relacionamento aberto nada mais é do que uma prisão, porque a pessoa só consegue se relacionar sendo infiel e desleal, da mesma forma que o viciado só encontra prazer na fissura da droga.
Ora, sejamos práticos. Se uma pessoa quer viver pulando de galho em galho, ela tem toda a liberdade do mundo para ficar solteira. Salvo raríssimas exceções, ninguém casa com uma arma apontada para a cabeça. Cada pessoa é livre para escolher viver só e sair com quantas pessoas quiser ou casar e fazer apenas uma pessoa feliz. Certamente é um desafio muito maior e exige muito esforço. O casamento não é autorrealizável. Ele exige dedicação e abnegação, mas a recompensa também é muito maior para quem faz esta opção.
A parte triunfal da entrevista para mim, e que desqualifica qualquer afirmação absurda dada pela entrevistada foi quando a Gabi perguntou a ela: você é casada? E ela respondeu: sim, pela terceira vez. Ou seja: se não funcionou para ela, vai funcionar para quem adquire os livros ou assimila as ideias dela? Não, não vai. Felizmente.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Uma nova revolução feminina

Atenção mulheres! Está na hora de descer do salto. Não, não estou falando sobre problemas ortopédicos ocasionados pelo uso exagerado de salto alto. Estou mesmo usando o sentido figurado e fazendo uma convocação extraordinária. Um estudo realizado pela Fundação Seade e pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) na região metropolitana de São Paulo apontou que embora a participação das mulheres no mercado de trabalho tenha crescido na última década, com grau de instrução superior ao dos homens, os salários delas continuam sendo menores.
Segundo a pesquisa, as mulheres ganham 75,7% do valor pago aos homens para o desempenho das mesmas funções. Ou seja, é para ficar bege, rosa chiclete e roxa de raiva, sim. Na prática, isto significa que mesmo saindo de madrugada e voltando à noite para casa, a fim de não perder seu espaço no mercado de trabalho, você continua recebendo menos do que os homens que fazem o mesmo percurso, porém, em sua maioria, sem precisar iniciar uma nova jornada ao chegarem em casa.
Sei que já falamos disto aqui. Mas uma coisa é ver que isso acontece com você, sua vizinha, sua prima e uma amiga da sua diarista. Outra coisa é um estudo apontar os vergonhosos números de um estudo feito na quinta maior cidade do mundo, onde se vê mulheres trabalhando em absolutamente todos os setores da geração de renda do País.
A esta altura, a pergunta que não quer calar é: por quê? Por que estamos sofrendo essa injustiça, se a ciência tem comprovado que nossa presença na cadeia produtiva é tão boa quanto, ou melhor que a dos homens? E isto não é mera suposição, como estão pensando aqueles que quase posso ver torcendo o nariz.
No primeiro semestre do ano passado, a Universidade de Duke, nos Estados Unidos, divulgou o resultado de uma pesquisa realizada com grupos de estudantes em que as mulheres se destacaram como melhores líderes nas atividades propostas. Recentemente, pesquisadores do MIT (Massachussetts Institute of Technology) e da Carnegie Mellon University concluíram, através de um estudo, que os grupos com maior número de mulheres têm mais inteligência coletiva (termo usado pelas duas instituições para definir o desempenho coletivo na realização de uma tarefa).
Para reforçar a tese, podemos utilizar também a opinião de Karen Pine, professora de Psicologia da Universidade de Hertfordshire, no Reino Unido, que lançou no final do ano passado, um livro chamado Sheconomics, que pode ser traduzido livremente como “ela e a economia”. De acordo com Pine, existem provas concretas da forte relação entre o sucesso financeiro das empresas e a presença de um número significativo de mulheres nos cargos mais altos.
O estudo do Seade/Dieese concluiu também que nos cargos com nível superior completo, a diferença de remuneração entre homens e mulheres é ainda maior: elas recebem 63,8% do valor pago a eles para as mesmas funções, menos que em 2000, quando esse percentual era de 65,2%. Isso mostra que precisamos, no mínimo, tomar uma providência urgente, antes de começarmos a pagar para engraxar as botas de nossos colegas de trabalho.
Este tipo de estatística só me faz acreditar realmente na velha história de que “Amélia é que era mulher de verdade”. Porque se temos que sair de casa para nos desgastar em empregos que nos cobram mais do que a eles, a fim de provarmos que merecemos estar lá e não vamos ganhar um valor justo por isso, temos que considerar a possibilidade de simplesmente desistir. Temos, rapidamente, de repensar os motivos que nos levam a buscar satisfação profissional. Temos que levantar urgentemente uma bandeira em prol de uma nova igualdade, que contemple direitos reais e não apenas o livre acesso ao mercado de trabalho.
Uma constatação destas me dá a impressão de que estamos sendo enganadas e continuamos acenando e sorrindo. Se a revolução para nos tornarmos iguais a eles nos trouxe tanto benefícios quanto prejuízos, possivelmente esteja na hora de uma nova revolução. Não uma revolução de armas e fogueiras, mas uma revolução de ideias, porque neste campo, o percentual é definitivamente favorável a nós.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Cisne Negro

Eu falo muito sobre filmes, mas não sou crítica de cinema, nem tenho a pretensão. Só que aprecio a sétima arte, quase um pouco mais do que as outras. E apesar de clichê, achei inevitável falar sobre Cisne Negro. A maioria dos filmes que são lançados durante um ano é apenas uma vírgula de entretenimento, em uma vida atribulada, mas Cisne Negro é uma tremenda pausa nessa regra. Cisne Negro é um enorme gancho de direita (sem alusão ao filme O Vencedor) em nossas convicções tão bem elaboradas sobre a vida.
Você já quis tanto alguma coisa, mas tanto, tanto, que ela conseguiu ebulir todo o resto de sua vida? Já apostou todas as suas fichas em algo sem o qual não imaginaria viver? Já depositou toda a sua confiança e devoção em um propósito, a ponto de ficar completamente fora do ar para qualquer coisa que não o envolvesse? Provavelmente sim. Talvez não com essa intensidade visceral, mas se está lendo, certamente lembrou-se de uma ocasião destas.
E se a resposta for realmente positiva, então você se identificou com o filme. Nina ficou tão focada em fazer um cisne negro perfeito para sua performance como bailarina na apresentação de Lago dos Cisnes, que em determinado momento achou que tinha se transformado em um. Quando as pernas dela se quebram, imaginariamente, no contexto de um surto psicótico, ficando arcadas como a de um cisne, você entende perfeitamente porque o Oscar de melhor atriz tinha de ser de Natalie Portman. Ninguém jamais fará aquele olhar de pavor como ela.
Mas, voltando à questão principal, o preço que Nina pagou para chegar onde queria foi alto demais. Ela precisou destituir-se de qualquer valor que sobrepujasse a importância de seu alvo. Precisou lançar mão de qualquer artifício que pudesse ser útil para torná-la um cisne negro perfeito. Precisou deformar o seu corpo, seu caráter e toda a sua vida para moldá-la ao seu grande objetivo.
E então você deve estar pensando: “ah, não, nunca cheguei a tanto”. E nesse ponto preciso lembrá-la ou lembrá-lo, de que todo alcoolismo começa com o primeiro copo; toda bulimia começa com a primeira náusea; todo adultério começa com o primeiro pensamento; todo grande roubo começa com um pequeno peso de papel. São os pequenos atos compulsórios que levam aos grandes vícios, salvo raras exceções.
Quando o objetivo que pretende alcançar faz você sacrificar a maioria das coisas que são importantes na vida, então, por melhor que ele seja, provavelmente, não vale à pena. Existe uma linha muito tênue entre a determinação e a loucura, quando o que se pretende está vazio de valores reais e crenças positivas. E isso me leva ao caso clássico de Hitler, que cria na supremacia da raça ariana e por isso matou milhões de pessoas.
Metas e objetivos são extremamente valiosos para a organização da vida. Não dá para caminhar por aí sem um foco. Quando uma pessoa perde o sentido das coisas que faz, costuma ficar perdida. Mas colocar expectativa demais nos eventos da vida causa um imenso sofrimento. Porque o casamento pode acabar, o emprego pode ser perdido, a casa pode desmoronar, o amigo pode trair, o exame pode dar positivo, a empresa pode falir, o sonho pode virar um pesadelo. E aí, se você apostou todas as suas fichas na mesma jogada, o chão vai sumir debaixo dos seus pés, o mundo vai desabar e todos os outros comparativos que se possa imaginar para a situação.
Claro que uma ruptura é sempre dolorosa. Só que ela não precisa ser desastrosa. Não precisa modificar a sua essência, mesmo que altere seu comportamento por um tempo. E esse equilíbrio só vai acontecer se você conseguir dosar o grau de determinação para realizar seus objetivos.
Deseje, creia, busque e aja, mas nunca permita que o seu desejo consuma você, no caminho para alcançá-lo. Existe uma diferença exponencial entre ser e parecer um cisne negro. Saiba identificá-la. Sua sanidade vale muito mais do que uma platéia aplaudindo em pé. Nisso, você pode apostar.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Às mulheres de 30 anos

Daqui a alguns meses terei 30 anos. Essa constatação me pegou de surpresa uma noite dessas, durante o ritual básico: escovar os dentes, lavar, tonificar e hidratar a pele, escovar o cabelo 32 vezes da raiz às pontas e vestir um pijama. Está bem, não é tão básico assim, mas é comum entre as mulheres. O fato é que foi naquele momento, entre o tônico e o hidratante que eu me dei conta do que são 30 anos de vida.
E parece que quase ninguém se dá conta disso. Ter 30 anos é quase como existir em lugar algum, sabe. Há músicas para mulheres de 40 anos. Há livros para mulheres de 50 que atingiram a menopausa. Há tributos para adolescentes que estão decidindo o que fazer da vida quando saírem do ensino médio. Mas ninguém se lembra das mulheres de 30, que não estão lá nem cá. Elas parecem apenas uma ponte entre a faculdade e a idade da loba. Ninguém nem nota.
Ainda posso lembrar de como era fácil dormir aos 16 anos. Bastava desligar o walkman e o abajur e pegar no sono. Sonhar então era mais fácil ainda. Agora parece simplesmente uma luta desenfreada contra uma manada (sim, manada) de ovelhas geneticamente modificadas que balem num tom tão agudo que é quase ultrassônico e correm milhas para não pular a cerquinha branca.
E não sei se foi o choque da percepção tardia ou este ensaio de ruga que se forma bem no cantinho dos olhos (mesmo quando não estou sorrindo) que me fizeram cair em profunda reflexão existencial. Eu tenho uma lista incompleta de coisas a fazer, que eu nem sei onde guardei e estou cumprindo os pré-requisitos da existência. Mas falta alguma coisa que talvez só quem esteja à beira dos 30 vai conseguir entender. Quem já passou por isso, talvez entenda, mas agora tem vontade de voltar e modificar as coisas, então, na verdade, nunca se sabe. Confuso não é? Nem tanto.
Repentinamente me dei conta de que os planos necessitam de certa urgência, porque 30 anos é uma coisa bem significativa. É metade de 60. É uma parte da vida. É a idade limite para a decisão de onde queremos chegar. Meus óvulos estão envelhecendo, minha profissão está envelhecendo, meus amigos estão envelhecendo. É praticamente uma oxidação em massa.
Não é o fato de envelhecer que incomoda. Talvez um pouco, mas não é o ponto principal. A questão é que chega um momento na vida em que as coisas têm que se resolver, têm que acontecer. As convenções sociais não servem apenas para nos oprimir e nos fazer desejar ser inseridos. Servem para cumprir as etapas da vida e consequentemente, causar realização. É difícil encontrar alguém que seja feliz sem cumpri-las.
Então, se você está perto dos 30 como eu, ou está exatamente nesta casa e também está com a lista incompleta, bem-vinda ao clube. Dizem que daqui a algum tempo passa e dizem também, que é a ansiedade que causa aquelas rugas terríveis. Então vamos tentar curtir um pouco essa passagem nebulosa, para ver o que acontece lá na frente, virando a curva. Pelo menos em tese, isso parece funcionar muito bem.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Para as fãs da saga Crepúsculo


Estive pensando sobre o fascínio causado pela saga Crepúsculo não só entre adolescentes, que é o suposto público-alvo dos filmes, mas entre mulheres e até homens em geral. Cada um tem seus motivos, mas suspeito que nada tem a ver com vampiros, lobisomens e coisas sobrenaturais.
E minha suspeita cresce quando vejo que entre os grupos enlouquecidos de fãs que se postam nas filas do cinema ou que colecionam tudo o que se refere à saga, estão mães de família, senhoras mesmo, segurando as pontas de seus cabelos e chorando à simples menção dos nomes de Robert Pattinson, Taylor Lautner e Kristen Stewart.
Tem muito de uma exagerada admiração a pessoas que elas nem se quer conhecem, mas acho que tem muito mais a ver com o romance. É, pode parecer um pouco clichê classificar assim, mas é um tipo de romance vicário, porque não há no mundo quem não deseje ser amada como Bella Swan, por quem os personagens estão dispostos a morrer o tempo todo e vice-versa.
E aquelas senhoras, que estão lá nas filas gritando, estão clamando por um pouco disso. Estão desejando que seus maridos ou companheiros sejam tão altruístas como o lobo que ama e não é devidamente correspondido ou como o vampiro que não aceita viver em um mundo onde “ela” não esteja. E então temos um enorme problema porque seria mais fácil acreditar que existem vampiros e lobisomens do que crer que existem Edwards ou Jacobs – e vai ser preciso que assista ao filme para entender isso.
Não estou recomendando, principalmente para as meninas, porque acho definitivamente que não são filmes para adolescentes. Há muita tensão sexual entre os personagens, além de fantasias maníaco-depressivas que podem influenciar essa classe de pessoas, que já enfrenta os desafios próprios da idade. Mas se não tiver outro jeito, acho que o melhor é mesmo assistir com os filhos e falar sobre essas coisas todas.
O fato é que os personagens principais estão o tempo todo se sacrificando uns pelos outros, abrindo mão, cedendo, correndo perigo e se doando completamente, sem reservas. E você não vê isso na vida real, pelo menos não como a regra. E então essa obsessão me faz crer que tudo não passa de uma fantasia feminina traduzida para os livros de Stephanie Mayer, que viraram uma série de filmes altamente lucrativos. É o sonho feminino personificado no amor entre uma menina comum, um vampiro sedutor e um lobo apaixonado.
Afinal, não sejamos hipócritas. Que mulher nunca sonhou com um homem que seja capaz de fazer absolutamente tudo por ela? Algumas de nós seriam capazes de se contentar com um que simplesmente fizesse metade disso. Certo, 30% então. Um que levantasse o sofá para você varrer embaixo e que fosse romântico o bastante para preparar um jantar ou abrir mão do controle remoto por algumas horas. Uau! Isso é tão Edward! Ou então um que dissesse belas palavras sem querer nada em troca, ou que parasse tudo para ouvir você por cinco minutos ininterruptos – tão, tão Jacob.
Vamos lá garotas, acordem! Isso não vai acontecer. Você vai encontrar em sua vida, muitos homens dispostos a algumas destas coisas, porém, não o tempo todo, como nos filmes. Você nunca vai ter um “imprinting” com uma pessoa que você não conhece, porque não é possível amar o conjunto de uma pessoa – suas qualidades e defeitos – sem conviver com ela o tempo mínimo, que seja. Se bem que quando conheci o meu marido, imediatamente, de alguma forma que não sei explicar, eu sabia que era “ele”. Então talvez essa parte tenha um pouquinho de realidade, confesso.
De qualquer maneira, o melhor a fazer é deixar que os filmes cumpram sua real função em nossa existência – a de entreter - e trabalhar da melhor maneira possível com aquilo que temos em mãos. Muita gente deixa de viver o amor verdadeiro, o real, o que é possível e palpável porque continua procurando um Edward ou um Jacob em um Maik Newton ou em um Eric.
E para quem não viu os filmes e está entendendo pouco do que leu, o que se pode dizer em resumo é: saia agora desse sofá que já tem as suas formas corporais desenhadas e olhe para seus amigos, vizinhos e colegas de trabalho (solteiros) com um pouco mais de condescendência. Quem sabe se o lobo apaixonado ou o vampiro devotado não está lá escondido, esperando ser descoberto?

Em construção

Todas as tragédias climáticas que atingiram o sudeste do Brasil e de forma mais traumática a região serrana do Rio de Janeiro me fizeram pensar. Pensar nas vítimas, nos que se foram, nos que perderam tudo, nos que perderam todos. Mas também naqueles que vão reconstruir. Naqueles que terão que começar do zero, que se obrigarão a ter forças para colocar tudo em pé outra vez.
Fico imaginando se vão querer colocar alicerces no mesmo lugar, se terão coragem de repetir o mesmo erro, não querendo julgar de quem é a culpa ou dividi-la em partes iguais entre governo e população. Apenas realmente fico conjeturando se vão querer as mesmas paredes, tudo exatamente igual ou se o que querem agora é transformar, esquecer e fazer tudo novo e diferente.
E então fico me questionando se é isso que fazemos diariamente. Nossa vida é toda planejada e vamos construindo paredes e escadas e varandas que muitas e muitas vezes se desfazem e viram poeira pelo ar. Construímos um quarto, pintamos, decoramos, penduramos retratos, enchemos vasos com lindas flores, mas de repente acontece alguma coisa inesperada e dolorosa e transforma nosso castelo em um amontoado de escombros.
É aí que acontece o dia seguinte. Muita lama, muita sujeira, muitos cacos para juntar, muitas feridas para curar. Mas ele está lá e temos que pensar em como colocar tudo no lugar e nos refazer, causando o menor dano possível. E é nesta hora que devemos planejar o que e como fazer novamente. Se vamos querer as mesmas cores, os mesmos móveis. Se vamos continuar pelo mesmo caminho que nos levou ao caos ou se é hora de mudar a planta e fazer um novo projeto.
Como mulheres temos ainda um “talento” especial de construir castelos nas nuvens, onde qualquer vento pode derrubar. Temos mais expectativas, esperamos mais dos outros, somos mais sensíveis às quedas. E ao mesmo tempo somos fortes o suficiente para carregar uma carga de tijolos e começar de novo. Talvez seja por isso que os homens tenham tanta dificuldade em nos entender. Eles apenas são ou não são fortes, ao passo que nós, respeitando-se as devidas exceções, somos frágeis como a pena e resilientes como o aço.
Em certo momento da vida percebemos então, que nossas escolhas já nos levam a paredes mais sólidas. Já conseguimos entender a dinâmica da construção da nossa existência e a decisão de que materiais usar se torna um pouco mais fácil. Aprendemos a selecionar os amigos, a cultivar a família, a admirar as pessoas certas, a administrar melhor as crises. E nem por isso, a construção estará terminada.
Nossa vida estará sempre em construção. Nunca chegará o momento da entrega das chaves. Sempre haverá o que resolver, sempre haverá um reparo, uma reforma e para muitos a reconstrução será constante. E isso não precisa ser ruim ou doloroso como é no caso de uma enchente. A construção diária de quem somos é um processo que embora não seja fácil, não precisa ser temido. O material de que somos feitos é bastante maleável e pode se moldar a novas situações, felizmente.