domingo, 14 de agosto de 2011

Chegadas e partidas

A apresentadora Astrid Fontenelle tem um programa no canal GNT que se chama Chegadas e Partidas. Ela apresenta o programa diretamente de um aeroporto, o local mais propício para chegadas e partidas diárias. Ali, ela entrevista pessoas que estão indo para algum lugar, a passeio ou definitivamente, bem como pessoas que estão voltando, nas mesmas condições. Muitas vezes, ela se emociona com os relatos de histórias de vida, que culminam com o ambiente do aeroporto, sempre inconstante, sempre passageiro, nunca estático.
O
nome do programa e algumas histórias me fizeram pensar no assunto, não por acaso. No último mês estou experimentando a readaptação a uma cidade pequena. E não só isso. A uma vida pequena. Não literalmente, mas pequena, no sentido de simples, menor. E isso poderia representar uma catástrofe na vida de alguém mais cosmopolita e urbano. Mas para mim, nada é mais recompensador do que abrir a janela e me deparar com uma paisagem technicolor – céu azul, planície verde, plantação amarela – com o perdão da pieguice.

E
m minha partida trouxe pouquíssima coisa na mala. E nem por isso ela estava leve. Carinho dos amigos, boas lembranças, o aprendizado de viver em uma cidade que não para, a expectativa de voltar a morar, tantos anos depois, na mesma rua onde passei parte da minha infância e quase toda adolescência. É uma bagagem e tanto, quase paguei excesso de peso!
E pensando sobre estas coisas, me deparei com a realidade de um sem número de mulheres. Homens também. Mas preciso ser fiel às minhas leitoras! Por isso pensei nelas. E em como é difícil lidar, na vida diária, com tantas chegadas e partidas.
Precisamos enfrentar as partidas literais – pessoas queridas que morrem, filhos que vão morar longe, amigos que nunca mais encontramos, mudanças de cidade, estado, país. E também com as partidas emocionais – pessoas que estão ali, mas que deixaram de nos amar, a beleza que vai embora, os anos que não voltam mais. É bastante coisa para se pensar.
E ainda temos que lidar com as chegadas. Ah, as chegadas são tão melhores! E mesmo assim, nos causam estranheza. Um novo filho, que não sabemos em que tipo de mundo será recebido, um novo amor, que não sabemos se ficará para sempre, um novo emprego, que nem imaginamos quanto exigirá de nós, uma nova condição de vida, que nos torna aprendizes outra vez.
E
assim seguimos a vida, permeada de chegadas e partidas. Nem bem desfazemos uma mala, já estamos arrumando outra. Para algumas de nós, a vida parece mesmo um eterno acampamento, já que nunca conseguimos, de fato, encontrar um lugar onde valesse à pena esvaziar a bagagem.

P
or isso amiga leitora, e por ventura, algum leitor simpatizante, meu humilde conselho é: não tenha medo das chegadas e partidas. Aceite as partidas com a mesma serenidade que aceita as chegadas. E creia que as mudanças, por piores que pareçam, nem sempre são de todo ruins. Você pode pensar que é filosofia de para-choque de caminhão, mas na verdade é a maneira mais digna de se enfrentar o trânsito intenso da vida.

Q
uando partir, escolha com sabedoria o que colocar na mala. Não carregue ressentimentos, inimizades, lembranças tristes, preocupações e uma lista enorme de coisas a fazer. Quanto mais simples for a sua vida, mais você encontra tempo para o que é essencial. E quando chegar, certifique-se de estar preparada para o novo, sem contudo, deixar de surpreender-se com as pequenas coisas. A vida é desinteressante para quem tem expectativas demais, mas pode ser assustadora para quem nunca espera nada dela.
Depois de tirar tudo da mala e encontrar um lugar adequado para cada coisa, passe um pano úmido nela e deixe secar ao sol. De vez em quando, tire ela do armário e deixe arejar por algumas horas. Você nunca sabe quando terá que partir de novo. E mais do que isso: desejo que você jamais se acostume com uma vida medíocre, onde nunca há chegadas e partidas. Muito mais vale contar os anos através dos bilhetes de passagem que compramos, do que passar a vida sentados num banco de aeroporto.